Conheci o Felipe em 2009 quando ele foi morar na cidade que meu pai morava. Apesar da distância, eu tinha bastante contato com ele, pois ia bastante pra casa do meu pai. Desde então essa amizade só foi crescendo. Em 2010 fui convidada por uma professora muito querida para participar de um projeto sobre políticas públicas de educação. Era um blog que discutia políticas públicas de educação e saúde mental, e eu seria a responsável pela parte da educação: escrever postagens, realizar entrevistas e fazer pesquisas. E de repente me vi mergulhada nessa área. Por causa do contato muito próximo com o Felipe eu comecei a estudar bastante as políticas públicas de educação inclusiva, a partir daí não parei mais e hoje, mais que nunca esse é o meu mundo. Fundar a L2 Psicologia e Inclusão faz parte da missão que tenho de devolver pra sociedade um pouco de tudo que estudei e ainda estudo. Colocar em prática esses conhecimentos e fazer diferença na sociedade na qual estou inserida. Sou psicóloga e mestre em psicologia com foco em educação inclusiva. Mas vamos voltar ao Felipe??? Ele mesmo vai contar um pouquinho dele pra vocês:

“sou Felipe Fortes Braz, tenho 28 anos e possuo deficiência visual devido a uma doença na retina, chamada Retinose Pigmentar.

A deficiência começou na fase da adolescência, entre 14 e 18 anos e considero-me cego desde os 18 anos.

No momento em que fiquei cego, procurei ajuda em centros de apoio a pessoa com deficiência na cidade que morei durante 20 anos, Santo André, São Paulo. Neste centro de referencia encontrei apoio para estudar e me locomover com o auxílio da bengala. Foi um grande processo de mudança e adaptações em minha vida.

A principal sensação que tive quando perdi a visão, foi a falta de segurança para caminhar. Com paciência, dedicação e o apoio da família fui enfrentando as dificuldades do dia a dia. Tinha o pensamento de que eu precisava aprender a ser “cego” para alcançar meus objetivos:

1 fazer um curso superior em física;

2 casar e construir minha família;

3 em cada lugar que estiver, ter a oportunidade de fazer grandes amigos.

Hoje em dia, lido relativamente bem com a cegueira. Me locomovo com o auxilio da bengala e utilizo leitores de tela para a comunicação e para os estudos.

A inclusão escolar entrou na minha vida de fato no período em que eu fazia curso pre-vestibular, também em Santo Andre, SP. Lá, os professores incentivavam e os colegas estudavam comigo.

Para realizar o vestibular, passei por grandes desafios, como ledores despreparados, tempo não adaptado e falta de material didático.

No ano de 2009, fui aprovado no curso de Física na UFLA (Lavras,MG). Após muito estudo e adaptações feitas para acompanhar o curso, conheci pessoas interessadas em promover a inclusão em um curso totalmente visual. Foi criado um grupo de estudo para discutir melhorias e pensar na seguinte questão:

como incluir uma pessoa com deficiência visual em um curso de física?

Deste grupo saíram ideias para produzir material didático acessível a pessoas que não podem ver, que dependem do sentido do tato e da audição. Com relação ao tato foram criados gráficos em relevo para sentir com as mãos o movimentos descritos pela mecânica clássica; para a audição foram gravados livros didáticos de tal maneira que eu tivesse autonomia de estudar.

Com essas estratégias, cooperação de professores e colegas do curso consegui chegar ao tão esperado dia da formatura no ano de 2014.

Logo em seguida ingressei no mestrado, na mesma instituição e com a utilização desses recursos me tornei mestre em Física no ano de 2016. Atualmente sou aluno do curso de Doutorado em Fisica na UFMG, onde tenho encontrado apoio da coordenação da pós-graduação e disposição do corpo docente para encontrar novas alternativas para a inclusão.”

Acredito que precisamos saber que pessoas como o Felipe existem. Pessoas com deficiência que sabem viver a vida, pessoas que não focam em suas limitações, mas em suas potencialidades!!! O Felipe tem uma vida independente, morou em república na época da graduação, longe dos pais, numa cidade que não conhecia ninguém. Pensa numa pessoa que é feliz, é o felipe! Sempre de bom humor, animado, adora um rolê e uma viagem. Sobre seus sonhos? Hoje não apenas físico, mas mestre em física e doutorando, sobre construir uma família? O Fê é casado, e muito bem casado com uma mulher maravilhosa e super companheira. Sobre fazer amigos? Não há nem o que dizer, basta estar perto dele pra saber o quanto ele é amado por todos a sua volta. Nunca desista dos seus sonhos, nunca pare de lutar!

Queremos que vocês tenham voz, tenham um espaço pra compartilhar com a gente e com outras pessoas sobre suas conquistas e desafios da vida diária. Esse é o primeiro post de uma série que compartilhará desses momentos e reflexões sobre a vida diária de uma pessoa com deficiência ou de pessoas que estão em contato direto com elas. Temos muito a aprender e refletir sobre o tema e compartilhar informações é uma excelente forma de saber que não estamos sozinhos nessa luta. Conte pra nós também sua história, mande-nos um email e sua história ajudará muitos outros leitores do Conte pra nós.

 

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