O Capacitismo e como cada um tem o seu lugar

Imagine a seguinte situação: Você está falando de uma pessoa para um amigo que não conhece essa pessoa. O que você usa para descrever a pessoa? Provavelmente você vai tentar falar do cabelo dela, sua altura, talvez a cor dos olhos. Mas se a pessoa tiver alguma característica um pouco mais marcante, pronto, você vai direto nela. Pensa aí! Se estiver acima do peso, já manda logo aquele “É um gordinho, sabe quem?”.

Acontece o tempo todo. As nossas características mais marcantes servem para nos identificar. Durante muito tempo eu fui identificado por usar óculos e por ter cabelo crespo. Hoje, ainda uso óculos, mas estou careca e com barba. É um prato cheio pra ser reconhecido por isso. E sempre tem um pra falar que eu sou “aquele que parece o Enéas” (sim, minha barba está grande daquele jeito)! Acaba sendo inevitável.

Não é diferente com uma pessoa com deficiência. E querendo ou não, muitas vezes a característica mais marcante de uma pessoa com deficiência acaba sendo sua deficiência. Acredito que não seja nem intencional isso. É natural aquilo que nos diferencia também nos identificar. E de um certo ponto de vista, é até legal! É justamente a combinação de nossas diferenças que nos torna únicos.

Mas o problema começa quando mais nada além da nossa diferença é notado. Quando as pessoas olham pra nós e só enxergam essa diferença. O que era uma forma de diferenciar acaba virando uma forma de limitar. Com as pessoas com deficiência é a mesma coisa. É natural que nos lembremos de uma pessoa, num primeiro momento, como “a menina da cadeira de rodas”. Mas se começarmos a achar que a menina se limita a uma pessoa que anda de cadeira de rodas, estamos cometendo um erro bem grave! Do mesmo modo que eu não sou meu cabelo, minha barba ou meus óculos, alguém que não ouve também não é a sua surdez, alguém com Síndrome de Down não é a síndrome e alguém com paralisia cerebral não é a paralisia.

Pode parecer óbvio isso, mas muitos ainda reduzem a pessoa à sua deficiência. Acreditam que a deficiência diz tudo sobre ela. Uma das formas mais comuns de se reduzir a pessoa à sua deficiência é achar que todas as áreas da vida da pessoa são limitadas pela deficiência, mesmo que não tenham nada a ver com ela. Por exemplo, é muito comum alguém contratar um cadeirante mas colocar ele para executar tarefas extremamente simples! Ora, um cadeirante que não tenha outra deficiência além da motora, tem capacidade para executar tarefas complexas sem problema algum! Mas mesmo assim, há muitos cadeirantes que são separados para trabalhar como empacotadores, anotadores de recado e outras tarefas simples. Veja bem, nada contra essas atividades, elas são tão necessárias nas empresas como qualquer outra, mas uma pessoa não precisa ter que executar uma delas só porque tem dificuldades motoras. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Esse tipo de comportamento é uma parte do que nós chamamos de Capacitismo.

O capacitismo é qualquer tipo de preconceito com a pessoa com deficiência, mas a palavra tem sido muito utilizada ultimamente para se referir a comportamentos e atitudes que diminuem a pessoa com deficiência. Quando se considera a pessoa menor ou menos capaz.

Você já deve ter ouvido falar do Michael Jordan né? Ele é o maior jogador de basquete de todos os tempos. Os números dele como jogador são tão impressionantes que será difícil algum outro jogador chegar perto um dia. Mas você sabia que o Michael Jordan abandonou as quadras para jogar beisebol? Isso mesmo, em 1993, após seu primeiro tricampeonato de basquete com o Chicago Bulls, ele decidiu se aposentar e ir tentar ser um jogador de beisebol. Ele então assinou um contrato com o Chicago White Sox e foi realizar o sonho do pai. O resultado? Um fracasso retumbante! Ele jogou apenas um ano, com números sofríveis que qualquer um de nós faria melhor, e se aposentou dos tacos jogando algo parecido com a Série C do Beisebol dos EUA! Depois dessa fase terrível, ele decidiu voltar ao basquete e aí ganhou mais 3 campeonatos pelo Chicago Bulls! Você pode ler um pouco mais sobre isso aqui.

Mas o que o Michael Jordan tem a ver com a nossa conversa?

A história do Jordan nos mostra que, na verdade, dependendo de onde você colocar uma pessoa, ela fracassará miseravelmente ou será um sucesso incontestável! Por que ao invés do supermercado colocar a pessoa como empacotadora apenas para cumprir a lei de cotas, ele não a testa em outros setores? Quem sabe ela pode ser um Ás do Excell! Ou então, trabalhar muito bem com cores e produz designs incríveis! Será que ela não consegue organizar melhor os produtos nas prateleiras?

A questão é que só saberemos disso se começarmos a ver além das deficiências. Enxergar a pessoa e não a limitação. Até porque, limitações todos temos e se formos julgados por elas, seremos todos fracassados! E o interessante é que, como vários outros conceitos envolvendo a inclusão, ela se aplica a toda a sociedade! Todos nós deveríamos ser vistos além das nossas dificuldades. As pessoas com deficiência se beneficiam muito disso, mas o mundo todo será um lugar melhor se passarmos a ver além da superfície! Deixa o Capacitismo de lado e veja além! O mundo agradece!

 

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