Bárbara Gordon, a Oráculo

Bárbara Gordon, a Oráculo

Eu sou um grande fá de histórias em quadrinhos. Estou sempre lendo uma coisa ou outra e indo atrás dos clássicos. Não sou muito de comprar as revistas mensais, mas gosto bastante das séries fechadas. Tenho aqui em casa várias graphic novels de diversos personagens, heróis ou não. E nem preciso procurar muito para encontrar um bom exemplo de representatividade das pessoas com deficiência no meio das personagens que tenho aqui na minha coleção.

Estão dispostas em duas meias luas as seguintes revistas em quadrinhos: 300 de Sparta, V de Vingança (em inglês), The Walking Dead, Supremo, Watchmen Volume 1, Watchmen Volume 2, Os Supremos Edição Definitiva, Batman O Cavaleiro das Trevas (em inglês) e Os Livros da Magia.

Watchmen é a melhor delas disparado.

A Oráculo

A Oráculo é uma super-heroína sem superpoderes. Quer dizer, depende do que você entende como superpoder, né? Porque ela simplesmente já coordenou as ações de todos os heróis da Liga da Justiça! Eu que tenho dificuldades de organizar minhas refeições pra comer de 3 em 3 horas jamais conseguiria fazer algo nem parecido.

Seu nome real é Bárbara Gordon, filha do Comissário Gordon (em algumas versões ela é filha adotiva ou sobrinha dele) e inicialmente ela não tinha deficiência nenhuma. Ela trabalhava como bibliotecária e tinha doutorado na área (o que já é bem impressionante). Mas após um tempo, ela decidiu combater o crime e escolheu o alter ego de Batgirl. Ela apareceu pela primeira vez ainda lá na Era de Prata dos quadrinhos, na década de 1960, atuando como heroína na cidade de Gotham. Às vezes estava junto com o Batman, com o Robin ou com o Asa Noturna (também conhecido como Robin com a roupa escura do Batman), mas na maior parte do tempo ela trabalhava de maneira independente, estabelecendo sua própria forma de combater o crime. Tudo ia bem até seu fatídico encontro com o Coringa na Graphic Novel Batman: A Piada Mortal. Sem querer dar muito spoiler, o resultado desse encontro foi, a princípio, trágico para Bárbara. Ela recebeu um tiro que atravessou sua coluna e a deixou paraplégica.

Parte da capa da Edição Especial de Luxo da HQ Batman A Piada Mortal. No desenho da capa aparece o Coringa apontando uma câmera para o leitor dizendo "Sorria".

O Coringa é o Catiço nessa história!

O que era pra ser o fim da luta contra o crime foi na verdade um recomeço. Após sua paralisia, ela usou suas habilidades de encontrar informações (ela era bibliotecária, lembra?) para estabelecer uma nova forma de combater o crime. Agora ela não saltava mais pela cidade usando uma capa preta, máscara e um símbolo de morcego no peito, ela usava sua mente para coordenar outros heróis e tornar muito mais efetivas suas ações. Saber como um vilão agiria, onde ele estava se escondendo e quais suas ligações estavam entre as suas habilidades. Ela tinha acesso a tantas informações e era tão eficiente que algumas vezes parecia que estava prevendo o futuro. O nome então vestiu como uma luva: Oráculo.

Atuando assim ela se tornou peça fundamental do universo DC. Ela jamais teria sido tão importante como Batgirl. A Oráculo continuou fazendo participações nas histórias de outros heróis até ganhar um título próprio com a história Aves de Rapina (Birds of Prey no título mais famoso em inglês) onde ela faz uma parceria muito importante com a Canário Negra. No início, a história se concentrou nessa parceria, com a Oráculo fazendo o papel de líder tático e a Canário atuando como agente de campo. Mas depois do sucesso da primeira história em 1996, o título se tornou uma publicação regular e continua sendo editado até os dias de hoje. Ao longo desse tempo, outras heroínas entraram para o grupo e sua configuração hoje inclui a Caçadora e a Mulher Gavião.

Após o reboot dado no Universo DC no início dos anos 2010 com o início da fase dos Novos 52, Bárbara Gordon recuperou o movimento das pernas e voltou a atuar como Batgirl. Mas seu legado como Oráculo estava plantado para sempre. A representatividade já estava feita!

O Legado

É interessante notar o que realmente representa ter uma personagem como a Oráculo presente na cultura pop. Há outros personagens com deficiências no mundo das HQs, mas ela foi a primeira heroína que adquiriu sua deficiência no decorrer das histórias regulares. Os outros personagens já vinham com a deficiência “desde sempre”. Com a Oráculo era possível ver a diferença entre a vida dela antes e depois da deficiência e como essa afetou sua atuação dentro das histórias. Foi possível ver como ela precisou se reinventar para continuar no seu propósito de conseguir um mundo melhor. E mais interessante ainda foi como ela assumiu o protagonismo real SOMENTE após sua deficiência. Quem conhece as histórias da Batgirl sabe que ela não era simplesmente uma versão feminina do Batman, mas que ela agia de forma própria e independente. Mas nada se compara à atuação de Bárbara como Oráculo. Ela não somente fazia parte dos grupos, mas tinha papel decisivo sempre. Seu conhecimento de computadores, seu acesso às informações, sua capacidade de atuar como hacker e sua inteligência incrível eram essenciais para o combate ao crime.

Normalmente os personagens com deficiência estão sempre centrados na sua deficiência e nas dificuldades que ela causa. A retratação da Oráculo era incrível porque a deficiência estava sempre presente na forma da sua cadeira de rodas, mas ela não era o centro. O centro era justamente aquilo no que ela era boa de verdade. Justamente como qualquer pessoa. É preciso mostrar pra todo mundo que o centro não são as dificuldades, mas as capacidades. Que estar numa cadeira de rodas é parte do dia-a-dia de um cadeirante, mas nem de longe isso o define. Que ele é muito mais do que simplesmente um cadeirante, que ele é um engenheiro, uma médica, um narrador, uma desenhista ou qualquer outra coisa. O protagonismo está no que essa pessoa consegue fazer e não naquilo que ela não consegue. E pense só comigo, é assim com todo mundo. O Batman é grande não porque ele não consegue voar como o Super-Homem, mas sim porque ele é inteligente o suficiente para não precisar voar. O mesmo acontece com a Oráculo e também com o Jorge, que trabalha lá na empresa e é cadeirante também.

Bárbara Gordon como Oráculo, sentada em sua cadeira de rodas em frente a diversas projeções de monitores. Um teclado de computador acoplado à sua cadeira de rodas está a sua frente e ela está digitando com a mão esquerda. A mão direita está erguida à sua frente interagindo com as projeções de monitores.

Bárbara Gordon atuando como Oráculo sentada em sua cadeira de rodas.

Só que eu não sou super-herói

Mas pensa só comigo, ela já era inteligente ANTES de adquirir sua deficiência. O tiro do Coringa não produziu nenhum efeito miraculoso que deu qualquer tipo de superinteligência ou super-habilidade para ela. A capacidade “especial” estava com ela desde o princípio e estava além do que a deficiência era capaz de alcançar. Esse é o segredo! Ir além da deficiência. Ela estava até feliz literalmente caçando criminosos pelas ruas de Gotham, mas realmente fez diferença quando descobriu seu lugar certo. Estar atrás de uma mesa, usando sua inteligência para “prever” as ações dos criminosos, foi o que deu a ela o nome de Oráculo e o que garantiu que ela fosse capaz de fazer diferença no mundo. Foi assim com ela e pode ser assim com qualquer pessoa com deficiência, basta entender qual é o nosso lugar.

Leia mais

Para conhecer mais sobre a história da Oráculo, eu indico ler o que já foi citado no texto: Batman: A Piada Mortal e as histórias das Aves de Rapina antes da mudança para os Novos 52. Pode não ser muito fácil encontrar as histórias mais antigas das Aves de Rapina, mas vale a procura. Além disso, ela está presente em várias histórias do Esquadrão Suicida, da Liga da Justiça e, é claro, do Batman.

Esse artigo discute o legado da Oráculo em vários campos (em inglês).

A página da Wikipédia em inglês sobre ela também é muito completa.

A enciclopédia colaborativa da DC também é uma fonte fantástica de informações.

Esse texto explica um pouco do significado da palavra Oráculo.

PcD na Cultura Pop

Esse é um artigo da série sobre a representatividade das pessoas com deficiência na cultura pop. Aqui debatemos um pouco sobre a forma como são retratadas as PcD nesse universo. Falamos sobre cinema, livros, músicas, HQs, desenhos animados, TV e tudo que estiver relacionado a isso. Os outros artigos dessa série você encontra na seção PcD na Cultura Pop.

Se você tiver ideias de personagens com deficiência e quiser contribuir, pode deixar nos comentários ou entrar em contato conosco através do e-mail contato@l2psicologia.com.br!

 

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